Linha de Passe (Walter Salles e Daniela Thomas, 2008) – 4º Cineport

Linha de Passe (Walter Salles e Daniela Thomas, 2008) **

Não se trata, de maneira nenhuma, de um filme que não se deve dar atenção, pois assim eu estaria o comparando às produções brasileiras da turma da Xuxa ou do Renato Aragão. Mas Linha de Passe tem um maniqueísmo absurdamente inquietante: tudo que é dito, tudo que os cerca, toda a situação não tem profundidade, não tem força narrativa. Os acontecidos passam a sensação de especialmente montadas para resultar na condução de um olhar específico. Existe no cinema uma diferença clara entre ter um olhar e buscar conduzir um olhar. Esta dinâmica se diferencia quando o que acontece na história responde às expectativas do espectador ou o surpreende de forma forçada. O primeiro exemplo se encaixa no que representa o filme de Salles e Thomas. As reações e consequências ao que acontece na vida dos personagens nada mais são do que aquilo que o espectador já acredita, mas precisa ter um “Walter Salles” atestando: que a periferia está na miséria, que mães solteiras sofrem, que motoboys podem se tornar marginais, que evangélicos muitas vezes são hipócritas.

O que temos, portanto, é a formulação de estereótipos num tom descaradamente armado – jogo, no pior sentido que a palavra possa ter no cinema. E não adianta dizer que há algo de Hou Hsiao-Hsien aqui, pois efetivamente não há. Não é de formulação de planos ou escolhas visuais que se forma uma influência de Hsiao, mas sobretudo de um olhar pouco interessado em formular teses sobre seus personagens. Pode-se afirmar, até mesmo, que Hsien faz cinema pouco preocupado em dizer alguma coisa – o que não é, nem de longe, uma realidade para esta obra de Salles e Thomas. O que não é exatamente um problema, desde que se tenha o interesse em construir com o espectador e não entregar tudo pronto. Se a inconclusão final sobre os personagens e certas cenas tem força e beleza própria e poderiam evidenciar isto, de quase nada servem diante dos caminhos confusos que o roteiro e direção do filme traçam como um todo.

Ricardo Oliveira

Assistido na Tenda Andorinha do 4º Cineport no dia 04/05/09.

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