Cidade do Amor (Lucas Souza, 2009)

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Um disco sobre o futuro

Antes de mais nada, é preciso ficar claro: Cidade do Amor é símbolo de um explícita linha divisora na carreira de Lucas Souza. E aqui me refiro, obviamente, a um excelente sentido. Seu novo CD é nada menos que seu melhor trabalho.

Partindo para um processo agora 100% autoral em parceria com o irmão e produtor Lúcio Souza, o cantor firma seu álbum no caminho daquilo que é pouco óbvio. Passamos por escolhas sonoras, de letras e conceitos que agora representam um todo coeso, ao contrário daquilo que nem sempre encontrávamos em seus CDs anteriores (mas a gênesi de tudo isto certamente estava lá). Em Capturado ou Caminho Para Revolução havia sim ótimas canções como as inesquecíveis “Estrela da Manhã” ou “Vou Ficar Aqui”. Entretanto, nos seus dois primeiros trabalhos, também tínhamos baixas que se evidenciavam em canções que simplesmente esquecíamos com o tempo ou não atraíam mais a audição. Lembramos ainda que, tal qual esse novo disco, eram produções independentes, feitas na base da coragem, levando também a nem sempre encontramos os melhores timbres. Havia a bela voz do próprio Lucas, a criatividade e destreza dos músicos, mas sempre faltou algo mais. Eis que nos encontramos com Cidade do Amor.

Este é, sem sombra de dúvida, o trabalho para o qual a dupla Lucas e Lúcio Souza parece ter se dedicado mais na busca pelo que há de melhor na função de um músico. Se o russo Tarkovisky diria que o cinema é a arte de esculpir o tempo, pensemos a música como a arte de desenhar as melhores ondas sonoras harmônicas, cadenciadas e melódicas. É possível encontrar em Cidade este desenho da primeira a última faixa – incluindo a secreta que vem logo após a número 12.

Para os leitores d’outros contextos, precisa ser explicado. Falamos de um cantor dedicado a falar de temáticas espirituais, claramente cristãs. Mas se isso deveria assustar em tempos de Regis Danese tocando em todas as rádios, incluindo as “não-cristãs”, calma: você está diante do trabalho de alguém que está exatamente distante de qualquer realidade de música dita cristã que você possa encontrar no Brasil. No mesmo caminho de qualidade que Lucas, hoje há apenas o Palavrantiga – parceiros de longa data e que receberam o mesmo belo tratamento musical do produtor Lúcio Souza em seu EP. Ao contrário do que representou o Doxologia na carreira de Lucas, não há mais ligações explícitas com a música de tempos remotos – seja ela de séculos passados ou de poucas décadas atrás. Cidade do Amor é um disco sobre o futuro. Seja ele o futuro que o próprio Lucas acredita (deste sentir e viver o céu e a eternidade, presente em todas as faixas) ou mesmo em caminhos vanguardistas neste contexto quase vazio que nos encontramos atualmente. Junto ao Palavrantiga, Lucas hoje representa aquilo que a música feita por artistas cristãos deve ser: viva e não permeada por proselitismo barato; cheia de um desejo menos pretensioso e mais simples no realizar boa música.

Em Cidade do Amor, temos desde guitarras a la The Edge ou John Mayer, até pianos que passam por Keane e Norah Jones. Em Cidade do Amor há britpop, indie rock, blues e soul sem parecer que todo esse ecletismo formará uma salada de momentos amargos. Na verdade, como já foi dito aqui, encontramos uma coesão entre as músicas que surpreende. É saboroso poder encontrar em cada faixa algum tipo de surpresa a mais, evidenciando aquilo que, de maneira mais genérica, parece ser a principal influência num álbum como esse. Refiro-me ao interesse experimental, passando pelo eletrônico, que vem de David Crowder Band.  Isso pode ser encontrado de forma mais evidente em “O Mundo Viu a Sua Luz” ou “O Lar”.

O que fica, portanto, é um álbum inteiro cheio de canções que têm muito a dizer sobre fé e espiritualidade e que ficarão na memória por um bom tempo. O trabalho de Lúcio Souza (o qual é responsável por boa parte das canções do disco) como compositor e produtor tem me surpreendido e com sua viagem agora para a Europa certamente isso crescerá ainda mais. Lucas Souza, depois de tanta expectativa criada ao redor do seu terceiro trabalho, conseguiu não apenas alcançar o esperado, como nos surpreender.

Ricardo Oliveira.

SERVIÇO

Lucas Souza Banda

http://www.lucassouza.com.br

Lúcio Souza

http://www.myspace.com/luciossouza

Cidade do Amor

R$ 15,00 na Farol Music.

15 Replies to “Cidade do Amor (Lucas Souza, 2009)”

  1. Oun, orgulhinho. Mas ainda acho
    um absurdo eu ainda não ter o meu.
    Escutei só antes da masterização,
    no carro, antes de fazer um book
    do Luke pelo centro. Tu devia ter
    mencionado: “AH, A TAL FOTO NO
    INTERIOR DO ENCARTE É DA
    TALENTOSISSÍSSÍCIIIIMA MANOELLA MARIANO.”

    ôe.. rs

  2. Excelente texto! Cidade do amor superou minhas melhores expectativas. Um trabalho primoroso e regado de graça!
    Lucas encontrou o ponto certo em cada música.Cada faixa consegue transmitir a mensagem do Amor de forma diferente e profunda, não consigo parar de ouvir.
    Em breve teremos o novo trabalho do Palavrantiga também, esse ano só está me trazendo alegrias musicais!!

  3. É muito bom ver coisa de qualidade surgindo na nossa música!
    Ótimas influências do Lucas também, né? só por curtir David Crowder e Delirious? já ganha ponto! rs

    E eu citaria junto com Lucas Souza e Palavrantiga os meninos do Crombie, com suas músicas belas e raras!

  4. Curto muito Lucas Sousa, meu chará! Mas o cd novo dele ainda não chegou em casa, mas to esperando! rs

    E nesta sexta dia 17/04 vai ele vai tocar aqui em Campinas!! To empolgado!

    Parabéns pelo blog e pelo trabalho, Ricardo!

    Abraço

  5. @wellington,

    Eu não citei Crombie na resenha, mesmo sendo fã dos caras, pelo fato de não se enquadrar nas mesmas questões estéticas e conceituais de Lucas Souza/Palavrantiga. Esses dois nomes ainda buscam músicas direta ou indiretamente para o ambiente eclesiástico, com referências explícitas e fé e tocando um estilo mais rock. Já o Crombie trabalha com uma poética mais livre que os anteriores, partindo pra influencias mais de MPB e pontadas de reggae. Mas, seguem no mesmo nivel de qualidade.

  6. ‘Cidade do Amor’ não me pega.

    A tentativa de inovar e o cuidado com a produção ficam claríssimos, e são dignos de elogios. Mas ao contrário de você, Ricardo, não consegui enxergar a coesão.

    The Edge ou John Mayer? Keane ou Norah Jones? Marisa Monte? Killers? A profusão de influências me incomodou bastante.

    Pelo conjunto da obra, ainda fico com ‘Caminho de Revolução’.

  7. Calma, @Luiz…sem pressa. Num se avexe nao que às vezes não dá liberar comments sempre que quero. Nunca iria deletar seu comentário sem razões. ;)

    Fale mais sobre como uma profusão de influências variadas te incomoda… Porque pra mim como músico, o resultado estético final é coeso sim. Enquanto obra artística musical pra mim as coisas estão muito bem delineadas no álbum…não há ruído pelo ecletismo – pelo contrário, se você observa esse ecletismo a partir da ideia de que Lucas Souza já tem certo estilo próprio, está tudo seguindo isso aí. Problemas que encontrei talvez sejam mais sutis detalhes de métrica das letras ou pequenas vocalizações do Lucas que poderiam ter sido podadas…mas nada que interfira demais no resultado final.

    Abs.

  8. hehehe! pode apagar o segundo ;)

    Não consigo enxergar muita ligação entre músicas como “Incomparável tanto amor” e as outras do CD, por exemplo. Pra mim, destoa muito. “Quebra e refaz” e “Teus olhos, meus horizontes”, mesmo que em menor escala, também me passam essa sensação.

    Tomando como base os trabalhos anteriores do Lucas, acho que Cidade do Amor se perde um pouco.

    Vamos de Coldplay (O Lar é bem parecida com Square One, repare) à Marjorie Estiano (Quebra e refaz) em 4 minutos.

    (A comparação com a menina não é uma crítica. Gosto do trabalho dela. Foi o que primeiro me veio à mente.)

    Não encontraríamos essa ‘salada’ nos CDs de artistas que influenciam o Lucas. No Day and Age, do Killers, talvez.

    Se eu estou sendo conservador demais, perdoem-me. É basicamente isso. Um pouco difícil de explicar por detrás do monitor.

    Também notei a questão da métrica. Mas é o velho embate Rock X Lingua Portuguesa. hehehe

    Espero sua resposta.

    Parabéns pelo blog. É alentador ver cristãos excelentes naquilo que fazem. Manoella ‘talentósissíma’ sempre falou bem de você. Sou aqui de Vitória e também estudo Jornalismo.

    Um grande abraço.

  9. Humm, o cara de cima é de Vitória.
    Nossa, ele deve odiar o Lucas mesmo kkkkk
    Parabéns cara, que inveja bonita de se ver.

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