Como os pingüins me ajudaram a entender o cansaço


por THIAGO BOMFIM

Já percebeu como as pessoas velhas resmungam de tudo? Nada parece bom e suficiente para elas. Não existe um meio termo para as coisas. Quando se serve uma sopa, estará gelada ou muito quente. Só existe muito salgado ou sem sal. “Ao ponto”, não faz parte do vocabulário dos idosos.

Mas antes que os critiquemos deixe que eu lhe avise: nós todos somos assim, alguns em intensidade menor, mas em geral somos resmungões de primeira e saibam, todos reclamamos com razão.

Rabugentos nunca são bem vistos. Reclamões são pessoas legais que incentivam longas conversas, que produzem boas risadas e grandes pérolas do pensamento. Alguns os chamam de filósofos. Por isso falaremos apenas dos reclamões ou resmungões.

Um pingüim viver em um clima tropical como o do Brasil pode soar como algo impossível, mas todos sabem que não é. Podemos encontrar pingüins em parques temáticos e em outros locais que tentam recriar uma atmosfera onde a sobrevivência do espécime seja possível, mesmo longe de seu ambiente natural. É desconfortável para eles. Imagine: ser tirado do meio de uma imensidão branca coberta de gelo, para viver em cubículos que com ajuda de ar-condicionados resfriam o ar, a fim de criar uma imitação barata de seu habitat natural.

Existe uma diferença muito grande entre viver e sobreviver. É possível se viver uma eternidade, mas se o viver significa estar sobrevivendo o tempo todo, isso logo nos trará cansaço, enfado e, claro, a morte.

Não fomos feitos para sobreviver, mas se você observar é exatamente isso o que você está fazendo: se coloca uma blusa de frio, logo, em alguma hora já estará com muito calor. Se não coloca vai passar frio. Se você dorme logo terá que acordar, se acordado está, provavelmente já precisa dormir.

E qual a diferença entre eu, Thiago, agora beirando os 22 anos, e a minha avó já acima dos 90? Ela já está sobrevivendo a mais tempo que eu, ou seja, tudo que ela carrega em sua bagagem é enfado e tudo que ela quer, mesmo que não de forma muito consciente, é descansar e ir para o seu habitat…terminar essa peregrinação.

Então se você como pingüim conhecesse a sua verdadeira casa, piaria (pingüins piam?), gritaria (?), e mostraria assim toda a sua insatisfação com a sua jaula.

Como humanos não fazemos diferente, reclamamos, nos chateamos facilmente, sabe por quê? Não fomos feitos para este lugar. Nada se encaixa em nós! Tudo que pegamos, tende a se soltar, tudo que vimos aos poucos nos cegam. Os sons que nos guiam, depois nos confundem e acabam por nos perder. Este não é o nosso lar!

Não tome isso como incentivo para se tornar um rabugento. Torne isso em esperança de um dia ir para seu lar. Enquanto isso, junte-se a outros reclamões e aprecie as coisas boas, os alívios dessa desconfortável estadia, e nunca deixe de resmungar.

Peço por final que não se atentem aos verbetes que definem isso ou aquilo, apenas entendam o que eu tentei dizer.

Fica aqui uma citação de umas das mais belas letras que conheço:

“Se eu encontrar em mim desejos que nada neste mundo pode satisfazer, eu só posso concluir que eu não fui feito para este lugar.”

Até a próxima Terça.

Thiago é um mineiro que mora em São Paulo e vive com um iPod tocando Jars of Clay. Adora uma música caipira e se pudesse, voltava pro interior pra passar a vida lendo seus livros.

One Reply to “Como os pingüins me ajudaram a entender o cansaço”

  1. Muito boa abordagem sobre o que é reclamar…

    Não consiste somente em resmungar mas também ter certeza de algo mais para a frente e também ter a possibilidade de desfrutar das coisas nos dias atuais…

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